PARALOGISMO ESTRATÉGICO
- martinricardoschulz
- 20 de ago.
- 4 min de leitura

Meus alunos são um laboratório vivo e dinâmico. Mantenho contato com vários deles desde 2003 numa espécie de paternalismo funcional. Eles me auxiliam na leitura (e tentativas de interpretação) de cenários, costumam estar ligados em perspectivas, compartilhamos conhecimentos. Volta e meia surgem questões maravilhosas, que provocam reflexão e a minha necessária pesquisa por respostas sempre mais elaboradas. Ultimamente, eu tenho recebido DMs deles, afirmando que “são CLT em determinada empresa e que acham que devem seguir carreira independente”.
Estariam apenas desmotivados temporariamente, ou engordando a estatística de self-employment? Essa é uma extensa reflexão. Inconformista, fui fazer perguntas sobre o porquê dessa posição e deparei com um certo padrão de respostas: O ó-do-borogodó é abolir os chefes. Essa moda me impacta por esse viés de autossuficiência exacerbada deles e, diante de uma sensação de obsolescência, pensei comigo: Havia um tempo - há não muito tempo, que os chefes eram nossa referência de sucesso, carreira, prosperidade e tantos outros adjetivos que pudéssemos adotar. No meu tempo de chefe, eu trabalhava para tudo isso.
Nas minhas andanças empresariais aproveitei para ouvir o ponto de vista da parte corporativa e aqui as coisas ficaram mais densas. O papo com as lideranças foi mais refratário, embora tenha sido facilitado pelo tema mais polêmico. Primeiramente experimentei um bom número de mecanismos de defesa, posições em que os gestores tentaram justificar uma racionalidade sobre os efeitos - os comportamentos, através de uma posição pragmática, sem dedicar atenção à possível causa, as emoções. Tipo assim, a culpa é minha, eu coloco em quem eu quiser.
Voltando à reflexão: conduzir os ativos humanos em uma empresa não é e nunca foi tarefa fácil, mas uma ampla janela de oportunidade. Pessoas que trabalham, não trabalham porque querem; trabalham porque precisam. Mas não apenas pelo sustento econômico e cada vez mais pela sua realização. Supervalorizam, portanto, suas emoções e experiências felizes dentro das empresas. Contudo, vejo firmas morrendo em perfeita saúde, desperdiçando o seu potencial com rotinas de tédio e estresse. Eu aprendi com um grande professor que, embora breve, a felicidade é um momento que nós não queremos que acabe, e isso aumenta a representatividade das emoções no contexto empresarial.
Vamos então retornar ao ambiente corporativo. Ao interagir com lideranças, o mais interessante foi concluir que a posição lá de cima também se desfigura quase como padrões: “eles não querem saber de nada”, “a gente faz treinamentos e eles não aprendem os processos”, “se você aumentar o controle, eles não aparecem mais”.
Sem exageros, é ou não é uma imensa lacuna? Arrisco a afirmar que é mais do que isso: é uma desregulação. Pior: é um raciocínio que parece verdade, mas não é verdade. Um paralogismo. Uma falsa verdade tão bem contada que nem sequer percebemos que se trata de um enorme erro. E mesmo que não seja voluntário, esse erro termina e começa dentro das empresas, organismos encarregados de estimular e regular essas relações.
A despeito das diferenças geracionais nas organizações (tema para outro texto), o ambiente empresarial é contaminado pela incerteza, pelo comportamento político das lideranças, pelos superegos, pelo comportamento estratégico tóxico e até pela complacência de comandos/controles. Uma lição que dissemino e carreguei comigo até o topo da pirâmide empresarial é que devemos contratar muito lentamente e demitir muito rápido, embora essa prática seja muito rara. O comum nas organizações é a contratação urgente porque alguém se ausentou e posterior enrolação na decisão de desligamento.
A questão toda é: por que somos pouco capazes em emocionar os nossos colaboradores? A resposta é simples: Porque não os conhecemos como deveríamos. Mas o que realmente queremos deles? Bom, dizem que um bom piloto a gente conhece pelo tamanho das pastilhas (de freio): Quanto maior estiver a pastilha, menos ele freia e, portanto, mais ele acelera. A realidade do empreendedorismo brasileiro, (bem) diferentemente da realidade em outros países, é frear por qualquer novidade ruim no cenário. Não é para menos, não há confiança suficiente e qualquer sinal de estabilidade. A ideia, portanto, de investigar e investir na estrutura organizacional é inócua nesse contexto.
Ok, mas essa não pode ser uma justificativa para não aportar políticas e rotinas laborais que pelo menos motivem os colaboradores através de senso de pertencimento, perspectivas claras e outros conceitos fundamentais de gestão. Lembrei da Lei 10101 - a da remuneração por resultados, que desde o final do ano 2000 é assunto tabu. A implementação de políticas e diretrizes nas empresas deve prever ações e desdobramentos que talvez não emocionem os colaboradores, mas que deem claras perspectivas a cada um sobre a seu crescimento no negócio. Ufa, teríamos pelo menos a posição clara de um dos lados.
As empresas precisam revisitar essa lacuna das posições divergentes entre a visão do colaborador e da organização. Cada empresa deve ter a sua toolbox de ferramentas motivacionais e adaptar as suas políticas de gente para padrões mais contemporâneos. A IA (ela de novo), embora esteja juniorizando as estruturas empresariais, substituindo cargos com méritos de escalabilidade, pode ser utilizada neste ecossistema que possibilita, não apenas reter os talentos na empresa, mas torná-la um recanto de boas práticas, atraindo assim outras capacidades. “O segredo não é correr atrás das borboletas. É cuidar do jardim para que elas venham até você”.




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